domingo, 1 de julho de 2012

A ideia que restava do tom acinzentado das nuvens

Era noite e o céu estava nublado, quando ela percebeu pela primeira vez. Tinha passado todo o dia fora, torcendo para que não caíssem pingos sobre sua cabeça, afinal, ela estava desprotegida, já que saíra de casa cedo e debaixo de um céu aberto e sem nuvens, inclusive.

                - O tempo é louco – pensou, enquanto abria o portão de casa, observando o céu fechar e alcançar a tonalidade cinza escuro.

Estava em casa. Agora sentia-se mais segura do que nunca. Era exatamente assim que o mundo soava quando estava debaixo das asas de sua mãe. Um sorriso e nada seria capaz de detê-la. Então, trocou de roupa, tomou uma xícara de café, e se pôs de frente ao computador, como de costume.


Sentiu um vento frio passar pelas costas, e olhou para a janela de casa. Era impossível perceber, de lá, as primeiras gotas de chuva caindo, mas agora, o barulho já era familiar. A chuva forte, prometida pelo tom acinzentado das nuvens, estava caindo sem previsão de acabar. Ela continuava digitando no teclado a sua frente, enquanto sua mente fazia o mesmo percurso de todas as anteriores noites chuvosas.

                - Você não vai olhar. Você não vai olhar. Você não vai olhar.

No instante seguinte, estava sentada na beirada do sofá, com a mão prestes a girar a maçaneta da porta principal. Por um lado ela queria ver o estado que estava a rua, e a forma como a chuva caia parecendo querer quebrar qualquer superfície sólida com a qual esbarrasse. E ela abriu. A maçaneta girou e ela pode ver aquela imensidão formada pela água que despejava do céu sem nenhum controle, juntamente com o reflexo dos holofotes que tentavam iluminar e facilitar a visão dos motoristas que passavam na avenida.

Naquele momento, como ela já imaginava, teve uma sensação estranha. Talvez não mais tão estranha como nas primeiras vezes. O medo. Um medo incontrolável de todo e qualquer estrago que aquela chuva poderia causar. Medo de que se tornasse mais forte, quanto mais o tempo corresse.
Fechou a porta, fitou o chão e repetiu para si mesma:

                - Para que ter medo, não?! Nas outras vezes foi a mesma coisa. Você lutou para não abrir, e abriu. O medo bateu, você fugiu, se enfiou no seu quarto, e rezou para que se isolasse do barulho e se concentrasse em outra coisa. Pensamentos sobre coisas boas, como diria sua mãe. – E sorriu ao lembrar-se da receita de sua mãe para qualquer situação assustadora. – Porque agora será diferente?

Ela entrou, sentou de volta ao computador, e se concentrou nas janelinhas que piscavam quando alguém tentava lhe chamar atenção. A chuva passou. Ela sorriu novamente ao olhar para a janela e ver que não escorriam mais gotas sobre o vidro. Pensou nas madrugadas que tremeu de medo, enquanto sua mãe dormia no quarto ao lado. Ela não queria acordá-la, apesar de saber que, se o fizesse, não seria incomodo algum. Lembrou a sensação de acordar do silêncio do seu quarto e abrir a porta dando de cara com o barulho no vidrinho do banheiro. Entendeu que aquilo não passaria durante as madrugadas, ao menos não tão cedo.


Ela diria a si mesma para não chegar à porta nunca mais. Mas, agora, sabia da importância que aquilo tinha para ela. Acima de tudo, ela deveria exercitar o que aquela pessoa lhe dizia sempre que ela desejava ser envolvida por suas asas novamente: “Pense em coisas boas, e os pensamentos assustadores vão passar.”. 

Logo concluiu. O fato é que seus medos não vão passar de uma hora para outra. E não vão deixar de surgir, afinal, sempre se tem medo do que é desconhecido. Talvez por isso houvesse sempre um impulso que a levasse a abrir a porta durante as tempestades, e enfrentar toda a imagem de caos que aquilo lhe passava. Para conhecer o que mais lhe afligia enquanto ela não podia observar. E, na sua cabeça, era  essa a ideia que restava do tom acinzentado das nuvens. 
                 
               - Ao que parece, não só o tempo é louco. O mundo é louco, juntamente com todos os fenômenos que se escondem aos nossos olhos. O estranho é louco, o diferente é louco, o sentir, seja lá  como for, é louco. Nós somos loucos. Afinal, quem pode atestar sua completa sanidade, não é?!

B.S.

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A ideia que restava do tom acinzentado das nuvens

Era noite e o céu estava nublado, quando ela percebeu pela primeira vez. Tinha passado todo o dia fora, torcendo para que não caíssem pingos sobre sua cabeça, afinal, ela estava desprotegida, já que saíra de casa cedo e debaixo de um céu aberto e sem nuvens, inclusive.

                - O tempo é louco – pensou, enquanto abria o portão de casa, observando o céu fechar e alcançar a tonalidade cinza escuro.

Estava em casa. Agora sentia-se mais segura do que nunca. Era exatamente assim que o mundo soava quando estava debaixo das asas de sua mãe. Um sorriso e nada seria capaz de detê-la. Então, trocou de roupa, tomou uma xícara de café, e se pôs de frente ao computador, como de costume.


Sentiu um vento frio passar pelas costas, e olhou para a janela de casa. Era impossível perceber, de lá, as primeiras gotas de chuva caindo, mas agora, o barulho já era familiar. A chuva forte, prometida pelo tom acinzentado das nuvens, estava caindo sem previsão de acabar. Ela continuava digitando no teclado a sua frente, enquanto sua mente fazia o mesmo percurso de todas as anteriores noites chuvosas.

                - Você não vai olhar. Você não vai olhar. Você não vai olhar.

No instante seguinte, estava sentada na beirada do sofá, com a mão prestes a girar a maçaneta da porta principal. Por um lado ela queria ver o estado que estava a rua, e a forma como a chuva caia parecendo querer quebrar qualquer superfície sólida com a qual esbarrasse. E ela abriu. A maçaneta girou e ela pode ver aquela imensidão formada pela água que despejava do céu sem nenhum controle, juntamente com o reflexo dos holofotes que tentavam iluminar e facilitar a visão dos motoristas que passavam na avenida.

Naquele momento, como ela já imaginava, teve uma sensação estranha. Talvez não mais tão estranha como nas primeiras vezes. O medo. Um medo incontrolável de todo e qualquer estrago que aquela chuva poderia causar. Medo de que se tornasse mais forte, quanto mais o tempo corresse.
Fechou a porta, fitou o chão e repetiu para si mesma:

                - Para que ter medo, não?! Nas outras vezes foi a mesma coisa. Você lutou para não abrir, e abriu. O medo bateu, você fugiu, se enfiou no seu quarto, e rezou para que se isolasse do barulho e se concentrasse em outra coisa. Pensamentos sobre coisas boas, como diria sua mãe. – E sorriu ao lembrar-se da receita de sua mãe para qualquer situação assustadora. – Porque agora será diferente?

Ela entrou, sentou de volta ao computador, e se concentrou nas janelinhas que piscavam quando alguém tentava lhe chamar atenção. A chuva passou. Ela sorriu novamente ao olhar para a janela e ver que não escorriam mais gotas sobre o vidro. Pensou nas madrugadas que tremeu de medo, enquanto sua mãe dormia no quarto ao lado. Ela não queria acordá-la, apesar de saber que, se o fizesse, não seria incomodo algum. Lembrou a sensação de acordar do silêncio do seu quarto e abrir a porta dando de cara com o barulho no vidrinho do banheiro. Entendeu que aquilo não passaria durante as madrugadas, ao menos não tão cedo.


Ela diria a si mesma para não chegar à porta nunca mais. Mas, agora, sabia da importância que aquilo tinha para ela. Acima de tudo, ela deveria exercitar o que aquela pessoa lhe dizia sempre que ela desejava ser envolvida por suas asas novamente: “Pense em coisas boas, e os pensamentos assustadores vão passar.”. 

Logo concluiu. O fato é que seus medos não vão passar de uma hora para outra. E não vão deixar de surgir, afinal, sempre se tem medo do que é desconhecido. Talvez por isso houvesse sempre um impulso que a levasse a abrir a porta durante as tempestades, e enfrentar toda a imagem de caos que aquilo lhe passava. Para conhecer o que mais lhe afligia enquanto ela não podia observar. E, na sua cabeça, era  essa a ideia que restava do tom acinzentado das nuvens. 
                 
               - Ao que parece, não só o tempo é louco. O mundo é louco, juntamente com todos os fenômenos que se escondem aos nossos olhos. O estranho é louco, o diferente é louco, o sentir, seja lá  como for, é louco. Nós somos loucos. Afinal, quem pode atestar sua completa sanidade, não é?!

B.S.

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A ideia que restava do tom acinzentado das nuvens

Era noite e o céu estava nublado, quando ela percebeu pela primeira vez. Tinha passado todo o dia fora, torcendo para que não caíssem pingos sobre sua cabeça, afinal, ela estava desprotegida, já que saíra de casa cedo e debaixo de um céu aberto e sem nuvens, inclusive.

                - O tempo é louco – pensou, enquanto abria o portão de casa, observando o céu fechar e alcançar a tonalidade cinza escuro.

Estava em casa. Agora sentia-se mais segura do que nunca. Era exatamente assim que o mundo soava quando estava debaixo das asas de sua mãe. Um sorriso e nada seria capaz de detê-la. Então, trocou de roupa, tomou uma xícara de café, e se pôs de frente ao computador, como de costume.


Sentiu um vento frio passar pelas costas, e olhou para a janela de casa. Era impossível perceber, de lá, as primeiras gotas de chuva caindo, mas agora, o barulho já era familiar. A chuva forte, prometida pelo tom acinzentado das nuvens, estava caindo sem previsão de acabar. Ela continuava digitando no teclado a sua frente, enquanto sua mente fazia o mesmo percurso de todas as anteriores noites chuvosas.

                - Você não vai olhar. Você não vai olhar. Você não vai olhar.

No instante seguinte, estava sentada na beirada do sofá, com a mão prestes a girar a maçaneta da porta principal. Por um lado ela queria ver o estado que estava a rua, e a forma como a chuva caia parecendo querer quebrar qualquer superfície sólida com a qual esbarrasse. E ela abriu. A maçaneta girou e ela pode ver aquela imensidão formada pela água que despejava do céu sem nenhum controle, juntamente com o reflexo dos holofotes que tentavam iluminar e facilitar a visão dos motoristas que passavam na avenida.

Naquele momento, como ela já imaginava, teve uma sensação estranha. Talvez não mais tão estranha como nas primeiras vezes. O medo. Um medo incontrolável de todo e qualquer estrago que aquela chuva poderia causar. Medo de que se tornasse mais forte, quanto mais o tempo corresse.
Fechou a porta, fitou o chão e repetiu para si mesma:

                - Para que ter medo, não?! Nas outras vezes foi a mesma coisa. Você lutou para não abrir, e abriu. O medo bateu, você fugiu, se enfiou no seu quarto, e rezou para que se isolasse do barulho e se concentrasse em outra coisa. Pensamentos sobre coisas boas, como diria sua mãe. – E sorriu ao lembrar-se da receita de sua mãe para qualquer situação assustadora. – Porque agora será diferente?

Ela entrou, sentou de volta ao computador, e se concentrou nas janelinhas que piscavam quando alguém tentava lhe chamar atenção. A chuva passou. Ela sorriu novamente ao olhar para a janela e ver que não escorriam mais gotas sobre o vidro. Pensou nas madrugadas que tremeu de medo, enquanto sua mãe dormia no quarto ao lado. Ela não queria acordá-la, apesar de saber que, se o fizesse, não seria incomodo algum. Lembrou a sensação de acordar do silêncio do seu quarto e abrir a porta dando de cara com o barulho no vidrinho do banheiro. Entendeu que aquilo não passaria durante as madrugadas, ao menos não tão cedo.


Ela diria a si mesma para não chegar à porta nunca mais. Mas, agora, sabia da importância que aquilo tinha para ela. Acima de tudo, ela deveria exercitar o que aquela pessoa lhe dizia sempre que ela desejava ser envolvida por suas asas novamente: “Pense em coisas boas, e os pensamentos assustadores vão passar.”. 

Logo concluiu. O fato é que seus medos não vão passar de uma hora para outra. E não vão deixar de surgir, afinal, sempre se tem medo do que é desconhecido. Talvez por isso houvesse sempre um impulso que a levasse a abrir a porta durante as tempestades, e enfrentar toda a imagem de caos que aquilo lhe passava. Para conhecer o que mais lhe afligia enquanto ela não podia observar. E, na sua cabeça, era  essa a ideia que restava do tom acinzentado das nuvens. 
                 
               - Ao que parece, não só o tempo é louco. O mundo é louco, juntamente com todos os fenômenos que se escondem aos nossos olhos. O estranho é louco, o diferente é louco, o sentir, seja lá  como for, é louco. Nós somos loucos. Afinal, quem pode atestar sua completa sanidade, não é?!

B.S.

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